top of page
  • Writer's pictureVânia Penha-Lopes

Londres, 19 de agosto de 2014

Mal cheguei a Londres e já tenho histórias pra contar.

No vôo do Rio pra Paris, notei que eu e o casal que sentava ao meu lado estávamos todos de casacos vermelhos. Perguntei-lhes retoricamente: "Hoje é dia de vermelho?". Eles não entenderam, então passei pro francês e eles riram e concordaram. Aí tirei da minha bolsa (também vermelha) meus óculos vermelhos de leitura e o casal riu mais ainda, apontando para os aros dos seus óculos, que também eram vermelhos. Que coincidência, né?


Na hora do jantar, a aeromoça que nos serviu mostrou-se assaz impaciente. Na fileira da frente, havia um asiático que não falava nem francês, nem inglês; isso a estressou. Ele titubeava pra escolher uma bebida, o que a fez retrucar, num inglês carregado: "Vamos! Tenho mais o que fazer". Quando o cara finalmente disse "Champanha", ela disse que isso já era, pois já tinham servido os aperitivos. Não me lembro do que ele acabou pedindo, mas os franceses acharam tudo muito engraçado; eu não. Ela já tinha sido impaciente comigo também. Não falo francês desde 2012, mas será possível que a minha pronúncia ao falar "Água mineral" foi tão incompreensível a ponto de ela precisar que os passageiros franceses servissem de cambonos? E será que minha pronúncia melhorou instantaneamente, já que depois disso ela entendeu tudo o que falei?

No curto vôo pra Londres, sentaram atrás de mim três cariocas que conversavam animadamente sobre o Brasileirão e a situação financeira do Botafogo. A essa altura do campeonato, eu estava caindo de sono e fui em cheio pros braços de Morfeu.


Na polícia federal, o policial me perguntou se eu tinha amigos em Londres. Com jetlag, pensei um pouco e respondi que não tinha mais nenhum. Ele retrucou: "Isso é muito triste". Adoro o senso de humor britânico! Então repliquei que o que dizer foi que todos os meus amigos que moravam em Londres não moram mais aqui. Ele respondeu: "That's better". Pândego!


Havia décadas que eu não vinha a Londres, mas já me senti aclimatada mesmo em Heathrow. O metrô, que está mais confortável ainda, me deixou numa estação pertinho do hotel. Foi uma viagem de uma meia hora, que custou a bagatela de £3,00. Já pensou se tivéssemos um serviço desses no Rio?


No terminal seguinte ao meu, eis que entram uma mulher com um menino. Instantaneamente achei que a conhecia. Pensei que fosse uma antropóloga carioca que provavelmente virá pro congresso, mas, quando ouvi o seu sotaque americano, achei improvável. Avisei a eles mais de uma vez que a sua mala tinha ou virado ou corrido pelo vagão. Um inglês, com a solicitude que lhes é notória, deitou a mala de um jeito que ela não correu mais. Aí foi a vez de a minha mala sair correndo, o que fez muitos passageiros rirem, pois isso já estava virando uma comédia de erros. Deitei a minha mala no chão e falei pro inglês: "Você devia ter patenteado a sua idéia" e ele e outros riram.


Então, a americana puxou um papo sobre o tempo frio que estava fazendo, até que lhe falei que ela me era familiar; ela disse que também achava que me conhecia. Perguntei se havia estudado na NYU, ela disseque sim e foi então que a minha memória voltou com força total: havíamos sido colegas de turma num curso sobre cultura judaica; na época, o cabelo dela ia até além da cintura e hoje, é batidinho na nuca; o menino é filho dela. Mencionei o nome da professora e ela me deu notícias dela. Lembrei à passageira que, mais de dez anos depois, nos reencontramos na Universidade de Virgínia. Isso foi há 16 anos. Ela confessou que havia me achado conhecida, mas não falou comigo porque pressupôs que era inglesa, ou seja, alguém que ela não conhecia.


Ambas ficamos espantadas com a coincidência. Porém, logo lembrei que, vira e mexe, isso acontece comigo. Pessoas do meu passado distante já haviam se materializado na minha frente em NYC, no Rio e em Paris. A diferença do caso de hoje foi ter acontecido com a mesma pessoa em dois continentes diferentes. O mundo é pequeno, gira e eu acabo revendo o meu passado.


Originalmente publicado no Facebook em 19 de agosto de 2014.

4 views0 comments

Recent Posts

See All

LONDRES, 22 DE AGOSTO DE 2014

Querido Público Fiel, Queria muito ter feito um relato ontem, mas foi um intensivão. Após a minha mesa, eu e Carmem Rocha fomos almoçar. Optamos por comida tailandesa, que eu não comia há quase três m

NYC-RJ NO NATAL DE 2014

Viajar é sempre difícil pra mim, independente da prática que tenho. Sempre aparece mais uma coisa pra resolver e fechar as malas é um processo árduo. Como trouxe muitos livros, minhas malas estavam be

Paris, 9 de julho de 2012 às 2:04h.

Sobre o dia anterior: Ontem à noite, comi um crepe que gerou muita conversa no restaurante. Quando finalmente fui dormir, apaguei.   Hoje, passei o domingo com a Mema aqui mesmo no XIVe. arrondissemen

bottom of page